DEFINIÇÃO
É definida como dor pélvica não menstrual ou não cíclica, com
duração de pelo menos seis meses, suficientemente intensa para interferir em
atividades habituais e que necessita de tratamento clínico ou cirúrgico.
ETIOLOGIA
A etiologia não é clara e, usualmente, resulta de uma complexa
interação entre os sistemas gastrintestinal, urinário, ginecológico, músculo-esquelético,
neurológico, psicológico e endócrino, influenciado ainda por fatores
socioculturais.
PREVALÊNCIA
A prevalência estimada de dor pélvica crônica é de 3,8% em
mulheres de 15 a
73 anos.
FISIOPATOLOGIA
Vários são os mecanismos que corroboram para a manutenção e/ou
evolução da dor pélvica crônica. Entre eles podemos citar:
1) mudanças neuroplásticas que ocorrem no corno posterior da medula
espinhal em consequência de mudanças eletrofisiológicas, bioquímicas e metabólicas
promovidas pelo estímulo nocivo inicial, o que leva à inflamação neurológica
devido à liberação de fator de crescimento neural e substâcia P na periferia, local
de origem do estímulo, exacerbando o mesmo;
2) sensibilidade cruzada entre vísceras que compartilham uma
mesma inervação (reflexo víscero- visceral); e
3) desenvolvimento de um reflexo víscero-muscular que pode
culminar não só em repercussões disfuncionais, como dificuldade miccional ou
incontinência urinária, mas também no desenvolvimento de síndrome miofascial e
geração de novos pontos de dor. Consequentemente, há uma sobreposição de
sintomas como dispareunia, dismenorréia, queixas gastrintestinais, geniturinárias
e músculo-esqueléicas.
Resumidamente, temos:
1. Dor de origem somática: o estímulo doloroso inicia em
estruturas como pele, músculos, fáscias, ossos e articulações. Frequentemente é
menos intensa, geralmente em pontadas, e a paciente, em geral, consegue
localizar um ponto específi co de dor;
2. Dor de origem visceral: usualmente é mal localizada, frequentemente
em cólicas, às vezes associadas a fenômenos autonômicos, como náuseas, vômitos
e reações emocionais;
3. Dor de origem psicológica: embora alterações de personalidade,
de conduta e depressão tenham papel bem definido na maneira de percepção da dor,
a dor pélvica crônica psicogênica é menos frequente e é diagnóstico de exclusão.
DIAGNÓSTICO
História clínica
Questionar características da dor (visceral ou somáica),
localização (mapa da dor), fatores de melhora e piora, duração e sua relação
com o ciclo menstrual. História obstétrica, número e tipo de partos, cirurgias
pélvicas anteriores, história de doença inflamatória pélvica, tratamentos clínicos
e cirúrgicos já realizados devem ser investigados. Informações sobre o aparelho
gastrintestinal e urinário devem ser pesquisadas, assim como o padrão menstrual
e dispareunia.
Mensuração clínica
da dor
As escalas unidimensionais mais empregadas são:
a) Escala analógica visual de dor;
b) Escala de categoria
numérica.
Exame físico
Durante o exame físico geral, especial atenção deve ser dada
ao modo de andar, características faciais de sofrimento e posturas antálgicas.
O exame abdominal deve iniciar com a inspeção de cicatrizes e
deformações; na palpação, verificar a presença de massas, aumento do tamanho de
vísceras e distensão de alças intestinais. Na avaliação da parede abdominal,
tentar identificar pontos dolorosos e/ou pontos de “gatilho” que desencadeiam dor
mais profunda ou em faixas musculares, inclusive na região inguinal. A palpação
da parede abdominal concomitante com manobra de Valsalva ou elevando a cabeça
com contração dos músculos da parede abdominal (teste de Carnett) é útil no
diagnóstico de dor de origem na parede abdominal (miofascial, endometriose em
cicatriz cirúrgica e hérnias) e de dor originária na cavidade pélvica – no
primeiro caso, a dor se mantém ou se intensifica, enquanto na última situação,
há tendência de a paciente relatar melhora da dor.
O exame pélvico deve ser realizado da maneira mais confortável
e delicada possível, pois a sensibilidade dolorosa dessas pacientes está frequentemente
exacerbada. A bexiga deve estar vazia. O exame deve se iniciar pela inspeção da
genitália externa (vulva, vestíbulo e uretra) à procura de lesões ou pontos dolorosos,
seguida pelo exame especular tradicional.
O exame vaginal, inicialmente unidigital, é realizado a seguir
para avaliação da uretra, base da bexiga e região do trígono na parede vaginal
anterior, tentando identificar pontos dolorosos de origem uretral ou vesical. O
próximo passo consiste na avaliação unidigital dos músculos do assoalho pélvico
(levantadores do ânus: pubococcígeos, puborretais e iliococcígeos; coccígeos;
piriformes e obturadores internos).
Na avaliação bi-digital, quando possível, atenção especial
deve ser dada à presença de irregularidades, nódulos e pontos dolorosos no
fundo de saco vaginal e ligamentos útero-sacros, que podem sugerir a presença de
endometriose pélvica.
O exame retal deverá ser realizado sempre que necessário, e,
nesses casos, o septo reto-vaginal deve ser avaliado cuidadosamente para verificar
a presença de nodulações dolorosas sugestivas de endometriose. Desconforto
muito intenso no toque retal pode estar associado também com síndrome do
intestino irritável.
Exames subsidiários
A ultra-sonografia transvaginal e de parede abdominal ・indicada quando há suspeita clínica de
endometriose e/ou massas pélvicas.
A dosagem sérica de CA-125 é util na complementação diagnóstica
para os casos com suspeita diagnósttica de endometriose severa e massas anexiais.
Indica-se o teste urodinâmico com avaliação da capacidade
vesical, associado ao exame de urina tipo I, urocultura e cistoscopia com
biopsia dirigida; esta é indicada na suspeita de doenças do sistema urolítico.
TRATAMENTO
Os analgésicos de primeira linha, antiinflamatórios não
hormonais e acetaminofen podem ser as drogas de primeira escolha.
Os opiáceos estão indicados quando não houver resposta ao
tratamento prévio.
Drogas miorrelaxantes podem ser usadas com sucesso em
pacientes nas quais a presença de espasmos musculares ou tensão contribuem para
a manutenção da dor.
O tratamento cirúrgico fica reservado para patologias específicas,
comprovadamente associadas à dor.
Fonte:
Abordagem da dor pélvica crônica em mulheres
Antonio Alberto Nogueira, Francisco José Candido dos Reis,
Omero Benedicto Poli Neto.
Rev
Bras Ginecol Obstet. 2006; 28(12): 733-40.
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